segunda-feira, 31 de outubro de 2011

o cinema da blax ploitation (CCBB)

blax ploitation nos CCBB Rio de Janeiro e São Paulo (3 a 13 de novembro) e no CineSESC (18 a 24 de novembro)

melhores informações em: http://www.blaxploitation.com.br/index.php


DEBATES

DE SUPER FLY A TIÃO MEDONHO: O NEGRO NO CINEMA AMERICANO E BRASILEIRO

Rififi no Harlem, em 1970, foi o primeiro filme de um diretor negro com elenco negro a obter sucesso – tendo sido campeão de bilheteria. Dois anos depois, Super Fly derrubou O poderoso chefão da posição de maior bilheteria dos Estados Unidos. Tanto em Super Fly como em Assalto ao trem pagador, o protagonista vem do mundo do crime: Super Fly é traficante enquanto Tião Medonho é assaltante. Nesse debate consideramos os papéis dos atores negros no cinema americano e brasileiro.

CCBB SP – DIA 4 DE NOVEMBRO 19h
Jeferson De é um cineasta paulista nascido em 1969 e formado em cinema pela ECA/USP. Militante da causa negra no cinema brasileiro, em 2005, lançou o manifesto Dogma Feijoada, uma análise histórica sobre a produção audiovisual dos negros no Brasil – que depois gerou o livro Dogma Feijoada e o Cinema Negro Brasileiro. Em 2003, fundou a produtora Barraco Forte. Dirigiu o curta-metragem Carolina, vencedor do prêmio de melhor curta-metragem e Prêmio da Crítica no Festival de Gramado. Sua estreia em longas-metragens foi em 2010 com o filme Bróder, cujo roteiro foi selecionado para o VI Laboratório de Roteiros do Instituto Sundance, e que estreou no Festival de Berlim. O filme recebeu o Prêmio da Crítica de melhor longa-metragem, além dos prêmios de melhor direção de arte, de som e fotografia no Festival de Paulínia de 2011.

Josiah Howard é autor e crítico americano formado em Filme e Televisão pela Universidade de Nova York. Grande estudioso, colecionador e entusiasta da cultura pop e cinema dos anos 1970, seus contos, artigos e fotografias têm sido publicados em inúmeras revistas e jornais. Ele é autor de Donna Summer: Her Life & Music (2003) e Blaxploitation Cinema – An Essential Guide (2008) – considerada a mais completa obra sobre esse gênero. Seu livro sobre a cantora Cher, Cher: Strong Enough, está em processo de finalização.

CCBB RJ – DIA 5 DE NOVEMBRO 18h
Marcos Romão é jornalista e sociólogo. Coordenador da Rádio Mamaterra de Hamburgo e ativista do movimento negro, é o criador da Mamapress, a primeira agência de notícias com um olhar indígena-afro-brasileiro da Europa. Mora em Hamburgo, Alemanha.


Programação CCBB-RJ - 1 a 13 de novembro
01/11/2011 - Terça-Feira

Sala 1
18:00h - Rififi no Harlem, EUA, 1970, cor, 97 min, 35mm, 16 anos
20:00h - Cleópatra Jones, EUA, 1973, cor, 89 min, 35mm, 16 anos

02/11/2011 - Quarta-Feira
Sala 1
15:30h - Shaft na África, EUA, 1973, cor, 120 min, DVD, 16 anos
18:00h - O grande golpe de Shaft, EUA, 1972, cor, 104 min, DVD, 16 anos
20:00h - Shaft - O filme, EUA, 1971, cor, 100 min, 35mm, 14 anos

03/11/2011 - Quinta-Feira
Sala 1
18:00h - Killer of Sheep, EUA, 1977, p&b, 83 min, 35mm, 16 anos
20:00h - O chefão do gueto, EUA, 1973, cor, 87 min, 35mm, 14 anos

04/11/2011 - Sexta-feira
Sala 1
18:00h - Shaft - O filme, EUA, 1971, cor, 100 min, 35mm, 14 anos
20:00h - Cleópatra Jones e o cassino de ouro, EUA, 1975, cor, 94 min, 35mm, 16 anos

05/11/2011 - Sábado
Sala 1
16:00h - Superfly, EUA, 1972, cor, 93 min, DVD, 16 anos
20:00h - Rififi no Harlem, EUA, 1970, cor, 97 min, 35mm, 16 anos

06/11/2011 - Domingo
Sala 1
16:00h - O chefão do gueto, EUA, 1973, cor, 87 min, 35mm, 14 anos
18:00h - Sweet Sweetback’s Baadasssss Song, EUA, 1971, cor, 97 min, DigiBeta PAL, 18 anos
20:00h - Killer of Sheep, EUA, 1977, p&b, 83 min, 35mm, 16 anos

08/11/2011 - Terça-Feira
Sala 1
18:00h - Foxy Brown, EUA, 1974, cor, 94 min, 35mm, 16 anos
20:00h - Jackie Brown, EUA, 1997, cor, 155 min, 35mm, 18 anos

09/11/2011 - Quarta-Feira
Sala 1
17:30h - Mandingo – O fruto da vingança, EUA, 1975, cor, 127 min, Blu-ray, 16 anos
20:00h - Coffy, EUA, 1973, cor, 91 min, 35mm, 16 anos

10/11/2011 - Quinta-Feira
Sala 1
17:30h - Shaft na África, EUA, 1973, cor, 120 min, DVD, 16 anos
20:00h - O grande golpe de Shaft, EUA, 1972, cor, 104 min, DVD, 16 anos

11/11/2011 - Sexta-feira
Sala 1
18:00h - Sweet Sweetback’s Baadasssss Song, EUA, 1971, cor, 97 min, DigiBeta PAL, 18 anos

12/11/2011 - Sábado
Sala 1
13:00h - Jackie Brown, EUA, 1997, cor, 155 min, 35mm, 18 anos
20:00h - Foxy Brown, EUA, 1974, cor, 94 min, 35mm, 16 anos

13/11/2011 - Domingo
Sala 1
13:30h - Mandingo – O fruto da vingança, EUA, 1975, cor, 127 min, Blu-ray, 16 anos
18:30h - Superfly, EUA, 1972, cor, 93 min, DVD, 16 anos
20:30h - Wattstax, EUA, 1973, cor, 98 min, 35mm, 16 anos

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Cristiane Sobral lança livro na Kitabu - 28/10

clique na imagem para ampliá-la.

Não vou mais lavar os pratos - Cristiane Sobral


Não vou mais lavar os pratos.
Nem limpar a poeira dos móveis.
Sinto muito.
Comecei a ler.
Abri outro dia um livro e uma semana depois decidi.
Não levo mais o lixo para a lixeira.
Nem arrumo mais a bagunça das folhas no quintal.
Sinto muito.
Depois de ler percebi a estética dos pratos, a estética dos traços, a ética, a estática.
Olho minhas mãos bem mais macias que antes e sinto que posso começar a ser a todo instante.
Sinto.

E-books cabo-verdianos (IBNL)

Uma excelente dica para adquirir livros cabo-verdianos do Instituto Biblioteca Nacional (IBNL) são os e-books à venda em http://www.recortes.cv/eBooks/  Títulos de Manuel Brito-Semedo, Carlota de Barros, Baltasar Lopes, Ondina Ferreira, entre outros.

Abraços,
Ricardo Riso

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

I Ciclo de Palestras sobre Cultura Afro-brasileira na Escola

O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro - campus Nilópolis promove o I Ciclo de Palestras sobre Cultura Afro-Brasileira na Escola. Nosso objetivo é promover a reflexão sobre a Lei 10.639/03, que estabelece o ensino de cultura africana nas escolas públicas e privadas.

18 de novembro de 2011, 9h às 17h
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro - campus Nilópolis
Rua Lúcio Tavares, 1045, Nova Cidade, Nilópolis - RJ

A Lei 10.639 de 9 de janeiro de 2003 altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências. O I Ciclo de Palestras sobre Cultura Afro-brasileira na Escola foi criado com o objetivo de suscitar a reflexão sobre o tema e apresentar possibilidades de aplicação da lei.

Programação:
9h mesa de abertura

Palestra 1 - 9h30min
Projeto Diálogos sobre Diversidade e a Lei 10.639/03 - Profª Rosália de Oliveira Lemos, Msc. (Coordenadora Geral de Diversidade - IFRJ) - 9h30

Palestra 2- 10h40min
Projeto AfroNil - Pedagoga Doris Regina Barros da Silva (IFRJ-Nilópolis)

Palestra 3- 13h
Arte Africana - Profª Rosane dos Santos Castanhede Kaplan (Coordenadora de Extensão do IFRJ- Campus São Gonçalo)

Palestra 4- 14h -
História do negro no Brasil - Profª Karla de Souza Moore

Palestra 5 - 15h
Cultura Afro-brasileira: uma visão antropológica - Prof ª Drª Fernanda
Delvalhas Piccolo (Coordenadora do CST Produção Cultural- IFRJ Nilópolis)

Palestra 6 - 16h
África na Literatura - Escritor e professor Rogério Andrade Barbosa

As vagas são limitadas! Para fazer sua inscrição gratuitamente, acesse o formulário abaixo:

Público alvo: profissionais de Educação, produtores culturais , alunos e outros interessados.

Fonte: e-mail gentilmente enviado pela Profª Leila Marins em 18/10/2011

ÁFRICA BRASIL II ENCONTRO INTERNACIONAL DE LITERATURAS, HISTÓRIAS E CULTURAS AFRO-BRASILEIRAS E AFRICANAS

ÁFRICA BRASIL II ENCONTRO INTERNACIONAL DE LITERATURAS, HISTÓRIAS E CULTURAS AFRO-BRASILEIRAS E AFRICANAS: Memória e Construções Literárias, organizado pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas Afro e o Mestrado em Letas da UESPI - Universidade Estadual do Piauí, que acontecerá de 15 a 18 de novembro deste ano, em Teresina - Piauí - Brasil

Nesses tempos de diálogo entre diferentes povos e nações, o objetivo do II ENCONTRO INTERNACIONAL DE LITERATURAS, HISTÓRIAS E CULTURAS AFRO-BRASILEIRAS E AFRICANAS DA UESPI é estabelecer intercâmbios dos saberes regional, nacional e internacional por meio da investigação científica e da interdisciplinaridade. O reconhecimento da história e do valor da cultura dos afro-descendentes e africanos pelo próprio negro e pelo não-negro desloca preconceitos e estereótipos elaborados ao longo de vários séculos de escravidão e desrespeito à humanidade dos povos colonizados pelo Ocidente. O nosso objetivo é promover um estudo sob a ótica da pluralidade, do respeito à diferença, visando ao intercâmbio, à troca de experiências através da transmissão de conhecimentos e conteúdos disciplinares atualizados nas áreas de Literatura, História e Cultura Afro-Brasileira, Africana, Indígena e Gênero.

DATA: 15.11 – TERÇA-FEIRA
14h Credenciamento
18h Abertura oficial do evento
18h30 Conferência de Abertura: Literatura Afro-Brasileira
Prof. Dr. Eduardo Assis Duarte - UFMG
20h Atividade Cultural
Coquetel
Lançamento de Livros – Salão do Livro Universitário – SALIU

DATA: 16.11 – QUARTA-FEIRA
8h Conferência: Toni Morrison: escrita dupla e memória negra
Prof. Dr. Roland Walter - UFPE
9h40 Coffee Break
10h Mesa Redonda: Literatura Africana Contemporânea
Profa. Dra. Maria Anória J. Oliveira – UNEB
Profa. Dra. Maria Elvira Brito Campos – UFPI
Prof. Dr. Amarino Queiroz – UFRN
Profa. Dra. Marly Gondim – UESPI
Profa. Dra. Tânia Lima – UFRN
Mediadora: Profa. Dra. Raimunda Celestina - UESPI
14h MINICURSOS
18h30 Conferência: E nós afrodescendentes: quem somos nós?
Prof. Dr. Francis Musa Boakari - UFPI (Príncipe de Serra Leoa)
20h Lançamento de Livros – Salão do Livro Universitário – SALIU

DATA: 17.11 – QUINTA-FEIRA
8h Conferência: O poder da identidade negra na poesia de Carlos de Assumpção
Prof. Dr. Luiz Silva (Cuti) – escritor dos Cadernos Negros e crítico literário – São Paulo
9h40 Coffee Break
10h Mesa Redonda: O Ensino da História e da Cultura Afro-Brasileira, Africana e Indígena (Leis 10.639/2003 e 11.645/2008): ensino e perspectivas
Profa. Viviane Fernandes Farias – representante do MEC
Profa. Dra. Ana Beatriz Sousa Gomes – UFPI
Prof. Dr. José da Cruz Bispo de Miranda – UESPI
Profa. Dra. Francisca Lúcia de Lima - UESPI/PREX
Mediadora: Profa. Dra. Maria do Socorro Baptista Barbosa - UESPI
14h COMUNICAÇÕES
18h30 MESA REDONDA DE ESCRITORES NEGROS
Cuti (Luiz Silva) – São Paulo
Elio Ferreira – Teresina
Henrique Cunha Júnior – Fortaleza
Miriam Alves – São Paulo
Ruimar Batista – Teresina
Tânia Lima – Currais Novos – Rio Grande do Norte
Mediador: Prof. Dr. Feliciano José Bezerra Filho - UESPI
19h30 Homenagem ao escritor Júlio Romão da Silva
Apresentação: Prof. Dr. Elio Ferreira de Souza – UESPI
Júlio Romão da Silva – Teresina (Escritor homenageado)
20h30 Apresentação do filme: Júlio Romão da Silva: um negro vencedor
Direção: Ací Campelo
21h Lançamento de Livros – Salão do Livro Universitário – SALIU
 
DIA 18/11 - SEXTA-FEIRA
8h Conferência: Os africanos escravizados no Brasil sabiam ler: aporte da história africana para a história brasileira
Prof. Dr. Henrique Cunha Júnior - UFC
9h40 Coffee Break
10h Mesa Redonda: Rebeliões negras e indígenas no Piauí
Prof. Dr. Solimar Lima – UFPI
Prof. Dr. Alcebíades Costa Filho – UESPI
Profa. Dra. Claudete Dias – UFPI
Profa. Dra. Wilma Carvalho – UESPI
Mediador: Prof. Dr. João Júnior - UESPI
14h Mesa Redonda: Literatura afro-descendente: identidade e gênero
Profa. Dra. Algemira de Macedo Mendes – UESPI
Profa. MSc. Assunção de Maria Sousa e Silva – UESPI
Miriam Alves – Escritora dos Cadernos Negros e crítica literária – São Paulo
Prof. Dr. Sebastião Alves Teixeira Lopes – UFPI
Mediadora: Profa. Dra. Maria do Socorro Rios Magalhães
16h Mesa Redonda: Religiões de matriz africana e relatos de experiência
Profa. Dra. Francisca Verônica Cavalcante – UFPI
Prof. Dr. Robson Rogério Cruz – UFPI
Babalorixá Oscar de Oxalá
Alíria Wiuíra Benício de Carvalho – indígena da nação Guajajara – graduada em Letras e pesquisadora do NEPA
Mediadora: Profa. Dra. Stela Maria Viana Lima Brito – UESPI
18h Conferência de encerramento::Cibernética e equação dos búzios: do Egito à contemporaneidade
Prof. Dr. Múleka Ditoka Wa Kalenga – República do Congo
20h Lançamento de Livros – Salão do Livro Universitário – SALIU
Atividades culturais
 
 
Fonte: e-mail gentilmente enviado pelo Prof. Dr. Amarino Queiroz (UFRN) em 20/10/2011.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Lia Vieira - Só as mulheres sangram (artigo)

Alguns aspectos de uma escrita negro-brasileira de autoria feminina em “Só as mulheres sangram”, de Lia Vieira

Ricardo Riso, 18 de outubro de 2011.

RESUMO: Os contos de Só as mulheres sangram, de Lia Vieira, procuram revelar diversos aspectos do cotidiano dos negros, em especial o cotidiano das mulheres. Ambientados em diversos espaços, os contos traçam um panorama abrangente dessas experiências negras excluídas do cânone literário brasileiro, apresentando paradigmas ainda não assimilados pela crítica literária tradional. A presente análise aborda os dilemas de um cotidiano negro urbano e rural, a preservação de um passado negro a partir da oralidade e escora-se na importância de uma literatura negro-brasileira, de uma escrita feminina negra, assim como na questão da afetividade entre os negros tendo como suporte teórico ensaístas como Cuti, bell hooks, Miriam Alves, Fernanda Felisberto e Sueli Carneiro.



Lia Vieira, pseudônimo de Eliana Vieira, é uma autora com vasta publicação de contos e poemas editados em “Cadernos Negros”, entre outras antologias no Brasil e no estrangeiro, assim como textos de não-ficção. De sua autoria, os livros “Eu, mulher” – mural de poesias (1990) e “Chica da Silva – a mulher que inventou o mar” (2001) e agora este “Só as mulheres sangram”, sob a chancela da editora mineira Nandyala e com prefácio da escritora e ensaísta Miriam Alves.

Só as mulheres sangram é uma recolha de nove contos que desvelam, em sua maioria, o cotidiano das negras brasileiras, entre outras situações nas quais transparecem as vivências de boa parte de nós, negros, em especial as mulheres, na sociedade brasileira, proclamada de democracia racial pela ordem vigente. Trata-se de um livro que se enquadra na literatura negro-brasileira, assim definida pelo ensaísta e escritor Cuti:

A literatura negro-brasileira nasce na e da população negra que se formou fora da África, e de sua experiência no Brasil. A singularidade é negra e, ao mesmo tempo, brasileira, pois a palavra “negro” aponta para um processo de luta participativa nos destinos da nação e não se presta ao reducionismo contribucionista a uma pretensa brancura que a englobaria como um todo a receber daqui e dali, elementos negros e indígenas para se fortalecer. Por se tratar de participação na vida nacional, o realce a essa vertente literária deve estar referenciado à sua gênese social ativa. O que há de manifestações reivindicatórias apoia-se na palavra “negro”. (CUTI, 2010, p. 44)

Por isso, a pertinência da leitura dos contos reunidos para acompanharmos um eu enunciador negro revelador de espaços de convivência comuns a nós, distante das descrições estereotipadas apresentadas no cânone literário nacional, principalmente por conter um olhar sensível às experiências das mulheres negras. De acordo com a escritora e ensaísta Miriam Alves:

A produção textual das mulheres negras é relevante, pois põe a descoberto muitos aspectos de nossa vivência e condição que não estão presentes nas definições dominantes de realidade e das pesquisas históricas. Partindo de um outro olhar, debatendo-se contra as amarras ideológicas e as imposições históricas, propicia uma reflexão revelando a face de um BrasilAfro (destaque no original) feminino, diferente do que se padronizou, humanizando esta mulher negra, imprimindo um rosto, um corpo e um sentir mulher com características próprias (ALVES, 2010, p. 67).

Com isso, os espaços são o presídio, o morro, a favela, a rua, o interior etc., apresentados por um viés que procura protagonizar a mulher negra, a relação com a afetividade, seus dramas e seus anseios, a luta para manter-se em um mundo opressor, tanto na questão racial quanto na questão de gênero. Luta que vai além do feminismo tradicional (de mulheres brancas), que não considerou as especificidades vivenciadas pelas mulheres negras duplamente subordinadas na sociedade, ser mulher e ser mulher negra. A respeito da não contemplação da mulher negra no movimento feminista, Miriam Alves afirma que:

as lutas e reivindicações femininas conquistaram alguns patamares do direito de cidadania plena, mas não consideraram as questões de raça, consequentemente de preconceito e discriminações, como também das desigualdades entre classes sociais.(...)
A militância feminista negra se distinguiu das bandeiras que impulsionaram o chamado movimento feminista brasileiro, pois para ela seriam outros os obstáculos a superar, em oposição à mentalidade de muitas mulheres brancas para as quais o conceito da feminilidade estava relacionada à brancura e à pureza, as quais não contemplavam as mulheres negras que tinham (e têm) que se desvencilhar de uma variedade de estigmas que correlacionam a cor e a trajetória histórica com inferioridade (...) (pp. 60-61)

Alves complementa que uma das lutas do movimento feminista era com a ruptura da imagem da mulher dona-de-casa, frágil e dedicada ao bem-estar da família, reivindicando outros papéis na esfera pública e a participação no mercado de trabalho. Sendo assim:

Torna-se compreensível porque a questão de identidade racial não fez parte do agenciamento feminista e não abrangeu a totalidade de mulheres, justamente as que já faziam parte do mercado de trabalho, em empregos e subempregos, mal remunerados e sem garantias trabalhistas, trabalhando como empregadas domésticas ou babás. (2010, pp. 62-63)

É essa condição diferenciada das mulheres negras jamais demonstrada nos livros consagrados de nossa literatura que fazem dos textos produzidos por essas autoras negras fundamentais, pois apresentam novos paradigmas ao emergir um mundo oprimido por séculos de repressão revelados no ato da escrita, conforme afirmar Fernanda Figueiredo:

Escrever, para estas mulheres, é ‘ultrapassar’ uma percepção única da vida; é construir mundos e neles apreender, discutir, apontar, enfim, serem agentes imprescindíveis à vida. As vozes-mulheres negras, são, portanto, as vozes, agora audíveis, não somente a própria voz, as vozes ancestrais silenciadas por séculos de exclusão. (...) Elas soltam as mãos e os olhares em seus teares, formando, aos poucos, nova roupagem para a literatura brasileira: a literatura afrobrasileira de autoria feminina. O papel das escritoras é escrever e inscrever a memória do povo negro pelo olhar de dentro; um olhar que recusa as omissões que a sociedade brasileira, sob a égide do mito da democracia social e racial, impôs e ainda impõe à população afrobrasileira (FIGUEIREDO, 2009, p. 105. Apud: ALVES, p. 66).

É na reconfiguração literária do ser feminino negro que outros espaços dedicados à afetividade revelam-se. Uma experiência comum às mulheres negras é a infeliz ambientação em presídios. Ainda que em um espaço rude e marginal, a afetividade da mãe a sua filha permanece intacta como vemos na pequena narrativa de “Por que Nicinha não veio?” Em um presídio, mãe presta solidariedade à filha presa, a segurança e o apoio aos quais precisaria para cumprir a pena, e assim as duas partilham os poucos momentos de união:

Só um alívio entre tantas outras iguais a fazia sobrevivente: a visita de Nicinha, sua mãe. Nicinha jamais fizera julgamento do seu gesto, nunca censurara ou se referira ao acontecido.
Trazia sempre palavras confortadoras, revistas, novidades que ali não tinham eco...
Mas fazia bem o jeito bom de querer que a mãe lhe passava.
Única amiga, cumpriam juntas a pena. Uma dentro, outra fora das grades. Não faltava nunca. Tinha sempre uma “coisinha especial”. (VIEIRA, 2011, p. 10)

Entretanto, o sistema carcerário é cruel, insensível aos sentimentos das pessoas, ou cabe a pergunta: uma presidiária negra possui sentimentos? A frieza parece ser o desdobramento natural para a total ausência de compaixão ao acontecimento seguinte, o motivo da visita não realizada de Nicinha:

Em seu armário, um bilhete pregado:
“Nicinha não virá mais. Foi atropelada no percurso até aqui.
Mais informações na Administração.” (VIEIRA, 2011, p. 11)

O rompimento abrupto da relação afetuosa seguido da desumanidade do gesto revela a maneira como essas mulheres negras são tratadas. Cumpre-se a pena determinada pela justiça, entre outras penas, tais como a da cor da pele, a de ser mulher negra e a de ser pobre. Injustiças e crueldades que também estão na narrativa de “Foram Sete”, na qual a violência sexual à mulher negra, no caso uma menina entrando na adolescência, é demonstrada. Infelizmente, uma situação comum às mulheres negras, tratadas como objeto sexual a serviço do homem branco, ou como muito bem esclarece Sueli Carneiro: “a apropriação sexual das mulheres do grupo derrotado é uns dos momentos emblemáticos de afirmação da superioridade do vencedor” (CARNEIRO, 2003, p. 49. Apud: EVARISTO, 2007, p. 24). A narrativa revela uma cena hedionda que vem desde os tempos da escravidão, aqui representada pelo personagem Safa-Onça: “Já outro (dia) clareava, com seu Safa-Onça em minha cabeça. Branco, macho e rico, seu passatempo era descabaçar menininhas. Assim falavam todos, assim sabiam todos, assim calavam todos” (p. 55).

Para além do abominável gesto de pedofilia, contudo, desvela-se um problema de nossa sociedade: a inércia da população diante de crimes contra à criança e ao adolescente, principalmente quando negros. Justiça que precisou ser feita pela personagem Flor de Liz escorada em seu guia protetor afro-brasileiro, o Seu Sete, desferindo sete facadas no facínora. Flor de Liz é uma dessas mulheres fortes que sempre procurou se manter “limpa, linda e jovem para sobreviver na cidade grande, principalmente no morro” e de como era importante a escolha dos companheiros, nem sempre considerando o amor. Assim imaginava os maridos para suas protegidas: “de preferência PM, para cuidar de nós todas. E Aruanda seria para um enfermeiro dali, bem perto, do Souza Aguiar, que consulta era difícil e remédio nem se fala e, do jeito que havia doença neste mundo, somente uma peixadinha dessa para aliviar” (p. 54). A narradora demonstra o quanto é difícil a vida para uma casa somente de mulheres negras, pobres, e a necessidade de ter homens que as protejam e garantam acesso facilitado à saúde, pensamento prático, pois notórias são as precárias condições de nossos hospitais públicos. Nesse ponto, percebemos a urgência de uma postura que induz a mulher negra, em razão de encontrar-se nas camadas inferiores da sociedade, a optar por uma suposta estabilidade e conforto a um relacionamento calcado na afetividade. Postura que lembra o passado escravocrata dos negros na diáspora, como bem investigou a ensaísta negra Fernanda Felisberto que discorre sobre a descrença no amor entre os negros (2011, p. 113), tendo como suporte teórico a feminista negra norte-americana bell hooks:

O sistema escravocrata e as divisões raciais criaram condições muito difíceis para que os negros nutrissem seu crescimento espiritual. Falo de condições difíceis, não impossíveis. Mas precisamos reconhecer que a opressão e a exploração distorcem e impedem nossa capacidade de amar. Numa sociedade onde prevalece a supremacia dos brancos, a vida dos negros é permeada por questões políticas que explicam a interiorização do racismo e de um sentimento de inferioridade. Esses sistemas de dominação são mais eficazes quando alteram nossa habilidade de querer e amar. Nós negros temos sido profundamente feridos, como a gente diz, "feridos até o coração", e essa ferida emocional que carregamos afeta nossa capacidade de sentir e consequentemente, de amar. Somos um povo ferido. Feridos naquele lugar que poderia conhecer o amor, que estaria amando. A vontade de amar tem representado um ato de resistência para os Afro-Americanos. Mas ao fazer essa escolha, muitos de nós descobrimos nossa incapacidade de dar e receber amor. (hooks, 2002,p.1)

Essa incapacidade de amar e o desejo sexual voltam a aparecer por um outro viés em “A paixão e o vento”, no qual um já veterano sambista sente uma irresistível atração por uma jovem passista de sua escola de samba, porém procura combater a sua libido em razão de conhecê-la desde criança e também evitar uma relação extraconjugal. Entretanto, o homem não resiste à tentação e parte para a consumação do ato:

“Sabe, num é por nada, mas achava que tu era uma criança.” Os olhos iam acompanhando-o, estreitando, enquanto Ritinha ia tirando as peças, um corpo desconhecido, embora já o tivesse visto e sentido diversas vezes, mas só que agora parecia diferente, real, tentação sedutora na brejeirice dos anos, viu-a nua, tesão, a ânsia de extravasar o gozo prometido... Bira puxou-a contra seu corpo, rolaram sobre o carpete macio, refez o quadro, a menininha tropeçando na quadra, o sorriso-criança. Ela pediu baixinho, “Faz gostoso, Bira”. A paixão dele era tão grande que, após tanto tempo, se convertera em fogo. Quis fazer... No dia em que finalmente se deram a conhecer, de suas entranhas brotou uma língua flamejante que reduziu o membro tão esperado a um montinho de cinzas.
***
Levantou-se da cama, foi à janela e, do parapeito, com carinho, começou a soprá-las ao vento... “Bira, você brochou...” Ele vestiu a roupa em silêncio, falou para o moço da portaria: “Vê lá o que a menina quer.” Subiu seu morro. No caminho, vendeu o tamborim... (VIEIRA, 2010, pp. 14-15)

Percebe-se que a narrativa subverte o imaginário a respeito das(os) negra(os) tanto na sociedade quanto (principalmente) na literatura canônica, como seres de libido incontrolável e sempre aptos para as relações sexuais. Dessa maneira, ao expor um negro que falha no momento da relação, a ponto de ao final se desfazer do objeto que os unia, e uma negra sedutora e bela que não consegue satisfazer o seu desejo, o(a) narrador(a) de Lia Vieira rompe com maestria essas personagens reais e literárias pré-determinadas, estabelecidas em nossas mentes.

Entretanto, retornaremos à questão da repressão de emoções afetivas entre negros e negras. Em sua tese de doutorado, Fernanda Felisberto, dentre outros assuntos, investiga a repressão de emoções em famílias negras em textos literários afro-estadunidenses e negro-brasileiros que remete à perpetuação desse sentimento como estratégia de sobrevivência ao sistema escravocrata. Felisberto recorre à análise de bell hooks:

A prática de se reprimir os sentimentos como estratégia de sobrevivência continuou a ser um aspecto da vida dos negros, mesmo depois da escravidão. Como o racismo e a supremacia dos brancos não foram eliminados com a abolição da escravatura, os negros tiveram que manter certas barreiras emocionais. E, de uma maneira geral, muitos negros passaram a acreditar que a capacidade de se conter emoções era uma característica positiva. No decorrer dos anos, a habilidade de esconder e mascarar os sentimentos passou a ser considerada como sinal de uma personalidade forte (...) Muitos negros têm passado essa idéia de geração a geração: se nos deixarmos levar e render pelas emoções, estaremos comprometendo nossa sobrevivência. Eles acreditam que o amor diminui nossa capacidade de desenvolver uma personalidade sólida. (hooks, 2002, p.4)

Da repressão afetiva à violência. O tema da violência contra a criança negra será aprofundado em “Operação Candelária”, conto que resgata a chacina da Candelária, ocorrida em 1993 e que deixou oito menores mortos. O conto revela a barbárie orquestrada pela alta sociedade e uma organização clandestina pronta para “mostrar de uma vez por todas que sabemos proteger nossas instituições” (VIEIRA, 2011, p. 49). Choca a incerteza da impunidade: “em breve, tudo aquilo não seria mais que notícias que logo deixariam as páginas dos jornais para se transformarem numa lembrança ou talvez numa lição, ou ainda num alerta” (p. 44). Ou ainda a tranquilidade irritante de um executor preparando-se para a ação: “Passa a mão pela face barbuda e gordurosa, vai atender ao telefone, mas o aparelho já emudeceu. Dirige-se ao banheiro e, com a indiferença de alguém que não tem nada urgente a cumprir, faz a barba” (p. 50). Essa tragédia revela a maneira como a alva elite brasileira e a polícia pensam a respeito de direitos humanos: “Agora, naquele momento, fazia-se necessária outra demonstração de força. Se, em 1988, os políticos defendiam os chamados Direitos Humanos, em 1992, a ladainha incluía algo: o Estatuto da Criança e do Adolescente” (p. 46). Inferimos que a ferocidade diante dos menores negros é um projeto elaborado com requinte, mostrando que nossas crianças negras devem ser mortas indiscriminadamente pelas forças de segurança e assim encher os negrotérios, um providencial neologismo inserido em poema de Éle Semog que aqui reproduzimos:

No meu país tão democrático,/ tão religioso e tão caridoso/ toda criança negra/ é um anjo vestido de morte./ De zero aos dezessete anos/ são precoces condenados/ para entrar no céu./ Para confirmar não precisa/ perder tempo perguntando a Deus/ é só olhar nos jornais/ ou ir ver a cor das mães/ nas portas dos negrotérios (SEMOG, 2010, p. 52)

Direito à vida, direito à terra como em “Rosa Farinha”, conto ambientado na zona rural de São Pedro d’Aldeia (RJ). A personagem-título é uma mulher-guerreira, conselheira na transmissão da sabedoria oral e líder de sua comunidade na Fazenda Campos Novos. Assim é descrita Rosa Farinha:

Temperamento marcante, vitalidade contagiante, irradiando uma convincente autoridade natural. Seus traços aristocráticos (...) refletem uma fascinante gama de sentimentos: tristeza e dor, alegria e beleza, coragem e esperança. (...)
Vinham para contar-lhe suas mágoas, pedir-lhe conselhos, ouvir-lhe os ensinamentos (...). Era muito simples o que ela ensinava. Dizia que somos maiores do que pensamos e a resistência é o caminho para romper os grilhões. Mas o que mais impressionava não era a doutrina, e sim a mulher, sua benevolência, a grandeza de alma, a determinação. (VIEIRA, 2011, p. 34-35)

Neste conto, há a preocupação na preservação da aprendizagem oral através dos provérbios que Tia Nilzimar herdou da avó – “Serviço de casa é tarefa de formiga: nunca aparece e nunca termina” (p. 36), do conhecimento das plantas medicinais, da preservação do passado escravocrata da família – “É curioso ver tia Mariazinha (assim chamamos tia Nilzimar) e vó Rosa na intimidade. Compartilham as mesmas histórias de engenho, de escravos forros, de passeios em carro de boi, de festas do estrudo, de pastorinhas” (p. 36) –, o cuidado ao resgatar a história dos nossos antepassados negros que foram deslocados para aquela região, traficados pelo porto de Búzios, e de como eram as relações sociais em um quadro marcado pela desigualdade:

Vó Rosa conta histórias ouvidas do desembarque clandestino de escravos na Enseada de Búzios. (...) Os mangues ofereciam boa lenha e os escravos aproveitavam para vendê-la a muita gente. Aceitavam alimentos e aguardentes em troca da lenha, que ia abastecer a cidade do Rio de Janeiro, cujos compradores aproveitaram este comércio por muito tempo. (p. 37)

O engessamento das classes sociais impunha um cotidiano imutável: “As tarefas ficavam estreitamente delimitadas e separadas. A discriminação racial e as distâncias sociais intransponíveis dividiam os mundos coexistentes e superpostos, a garantir a partilha desigual de direitos e deveres” (p. 38).

Contudo, o conto demonstra como a solidariedade marcou essa comunidade de negros e como as mudanças através do tempo foram alterando a rotina da região. A chegada do progresso e suas “melhorias” modificaram os meios de subsistência dessas famílias, triste e comum realidade de diversas áreas quilombolas da Região dos Lagos, espaço do conto, e conforme atestamos nessa passagem de Vó Rosa:

Tudo hoje é dividido. As únicas coisas que ainda se tem em comum são as casas da farinha e alguns poços d’água. Há cinquenta anos, a nossa fonte de alimentação era o peixe do brejo, era gambá, tatu, lagarto, que dava muito. Houve devastação e a coisa foi acabando. As coisas pioraram depois da obra de saneamento. Antes, tinha banana, laranja, quiabo, maracujá, mas o principal era a mandioca. Quando a lavoura estava ruim, a gente se refugiava na salina; quando o tempo melhorava, a gente voltava para a roça. (pp. 38-39)

Entretanto, a atuação de Vó Rosa destacava-se na defesa intransigente da sua terra. Corajosa, enfrentava milícias, tropeiros e coronéis com a ajuda de sua comunidade e escorando-se na cultura de sua gente “manifestando-se em cantos de vida e liberdade”. E assim criava a sua história pessoal, passava a vida e o seu projeto de viver inserido nessa batalha ininterrupta:

Vó Rosa tem passado a maior parte de sua vida nessa luta, tendo sido desafiada e desafiando (...) As ofertas e tentativas de intimidação não têm fim. Como se vive em permanente defensiva? O que a distingue não é apenas o seu carisma pessoal. A beleza desta velha senhora está no engajamento apaixonado e na vontade inquebrantável de uma mulher que se propôs um alvo político: o sistema comum de posse da terra, baseado na descendência dos antigos, seus usos e costumes. (p. 40)

Outra mulher de fibra é retratada no conto “Maria Déia”. Agora, no espaço urbano, no centro do Rio de Janeiro, as questões relacionadas à população negra e à terra são demonstradas pelo lado perverso das remoções de comunidades inteiras a favor do sempre discutível replanejamento urbano e quem são os favorecidos. A nós, negros, jamais. O espaço do conto é no antigo Morro do Santo Antônio, onde hoje abriga “o BNDES, o prédio da Petrobrás, a Caixa Econômica Federal e a Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro”.

Tragédias urbanas que não são levadas em consideração pelo nosso cânone literário, mas que a narrativa de Lia Vieira denuncia o desprezo das autoridades em relação à comunidade que ali vivia – “Não haveria diálogo. Estava tudo decidido”. (p. 64), as promessas dos políticos para convencer a população a ir para um lugar distante e a imprensa associada ao poder político apoiando a mentira – “conseguiram fazer-nos atravessar os noventa quilômetros de estrada esburacada. (...) Chamavam-se conjuntos residenciais. Noticiário na imprensa, do grande projeto do Governador.” (p. 67) –; as condições deploráveis reveladas de imediato à comunidade – “Uma pregação ideológica do engenheiro responsável sobre o nosso lar não desfez a impressão patética; dos rostos anuviados, corriam lágrimas. Construções inacabadas, quatro ou cinco andares de tijolos, nem praça, nem capela, nem água, nem privada” (p. 67). Ou seja, nada diferente do que acontece nas metrópoles brasileiras, mas que somente uma representante da literatura negro-brasileira como Lia Vieira é capaz de expor, de tocar o dedo na ferida e jamais deixá-la cicatrizar ao mostrar a faxina étnica que sempre acompanhou os “desenvolvimentos” urbanos das nossas cidades.

Por outro lado, a narrativa demonstra o re-enquadramento da população negra no espaço urbano carioca, “que o problema apenas podia ser resolvido com a ocupação das terras de outros morros” (p. 68). As comunidades passam a organizar-se à revelia do poder público: “Muitos anos vividos num gênero de vida em comum, sem ter que prestar contas a ninguém, sem obedecer a nenhuma autoridade que não fosse do seu meio. O tempo nos ensinara” (p. 68-69). Maria Déia casa-se com o líder comunitário Greg, que com sua habilidade e percepção associa-se a lideranças religiosas, contraventores, assistentes sociais etc., passa a exercer a segurança local com mão-de-ferro e comanda o tráfico de drogas: “O homem da Fortaleza podia tudo o que desejasse. Tornou-se polêmico, revolucionário, excomungado, inimigo das autoridades, políticos... A quem subornava com grossas propinas para obter as benfeitorias para a comunidade” (p. 70). Tudo sob os olhos de Maria Déia, que, para ela, “suas obras estão acima destas pequenas nuances e eu, como parte envolvida, me abstenho de julgamento” (p. 70). Aliás, como bem assinala o conto, Maria Déia foi o nome dado por sua mãe em homenagem ao casal de cangaceiros Lampião e Maria Bonita. Lampião, um líder que em dado momento da vida tinha apoio dos poderes políticos e religiosos do Nordeste, e tão controvertido quanto Greg. E ao expor a defesa ao seu amor, Maria Déia conduz nossa reflexão do quanto é difícil julgar diante das atrocidades vivenciadas pela comunidade negra carente, abandonada pelos órgãos públicos.

Ainda no conto, chega-se ao combate ao tráfico e seu marido Greg é morto pela polícia, na confusão, com o corpo morto do marido ao seu lado, Maria Déia desnuda a hipocrisia e a invasão de privacidade da imprensa, que adora mostrar a desgraça dos pobres: “Nada de choro e baboseiras! Alteou a voz, deixando a todos atônitos. É isso o que eles querem. Beber nossas lágrimas” (p. 73). Hipocrisia que norteou o enterro de seu esposo por meio das anônimas coroas de flores:

O enterro parou a cidade. Coroas de flores foram enviadas por bicheiros, pastores, umbandistas, comerciantes, políticos, chefões de outros morros e de outros Estados: todas sem identificação. O cortejo se estendeu por quilômetros. Panos pretos nas janelas em sinal de luto. Netos, filhos, afilhados que chegavam perto de cem. Tanta gente para dar o último adeus ao benfeitor, rostos exauridos de sofrimento e admiração. O céu encoberto onde se via uma profusão de fogos de artifício. Isolaram aquela morte. Lançaram-lhe um monte de abafo. Enterro anônimo coberto por um só programa de TV (p. 73).

Assinaláveis os contos “Provas para o capitão” e “He Man”, nos quais outros aspectos que envolvem a difícil rotina dos negros são apresentados. No primeiro, tendo como recurso para desvendar a história a polifonia narrativa, um negro é acusado e condenado injustamente por um assassinato. Sua pena: a cor da pele. A narrativa deixa clara a postura da polícia durante as investigações ao lidar com os negros no diálogo entre o detetive e seu subordinado:

– E o negro?
– Já está preso. Trata-se de um pobre diabo e está muito assustado. Mostrou-se dócil. Não creio que tenha ousado...
– Jamais acredite em nada, tenente... muito menos num negro. Se ele faz cara de infeliz, chora e suplica... são sempre teatrais. Compreendeu o que eu estou dizendo?
– Sim, capitão. É isso mesmo. (76-77)

Em “He Man”, o drama passa-se na noite de Natal. Alijado do consumo exacerbado e estimulado pela intensa propaganda em todos os meios de comunicação durante esse período do ano, um jovem negro decide furtar uma casa para conseguir presentes para sua família. O rapaz frustra-se com todos os cômados da casa trancados, apesar de estar em seu interior: “As lágrimas correm, não é choro verdadeiro, é mais como se fosse um peso insuportável, uma desesperança que queima” (p.18). Na saída, avista uma espada do He Man e a leva para o pequeno da família. É a exposição da desigualdade, da vida perversa fora do consumo, do fracasso de não poder ter e da falta de oportunidades que a maioria negra se enquadra e que são os estimuladores ao crime.

E é assim, atenta aos dilemas contemporâneos submetidos aos negros, preocupada em preservar na literatura o passado dos nossos antepassados negros por meio de sua “herança-memória”, assim como buscar na árdua luta diária de mulheres a afetividade para encarar a vida e em diversas outras situações as quais somos expostos, que as narrativas de Lia Vieira comprometem-se em subverter os códigos estabelecidos em nossa sociedade, por conseguinte, em nossa literatura, deslocando e estremecendo as certezas de uma sociedade injusta, desigual e racista, e que uma autêntica representante das mulheres negras escritoras insiste em revelar. E em incomodar... Assim são os contos de “Só as mulheres sangram”.



BIBLIOGRAFIA:

ALVES, Miriam. BrasilAfro Autorrevelado – literatura brasileira contemporânea. Belo Horizonte: Nandyala, 2010.

CARNEIRO, Sueli. Enegrecer o feminismo: a situação da mulher negra na América latina a partir de uma perspectiva de gênero. Apud: EVARISTO, Conceição. Literatura negra. Rio de Janeiro: CEAP, 2007.

CUTI. Literatura negro-brasileira. São Paulo: Selo Negro, 2010.

FELISBERTO, Fernanda. (Escre)vivências na Diáspora: escritoras negras, produção editorial e suas escolhas afetivas. Uma leitura de Carolina Maria de Jesus, Conceição Evaristo, Maya Angelou e Zora Neale Hurston. Rio de Janeiro: Programa de Pós-Graduação em Letras/Literatura Comparada, Universidade Estadual do Rio de Janeiro/Faculdade de Letras, 2011. (Tese de Doutorado)

FIGUEIREDO, Fernanda Rodrigues de. A mulher negra nos Cadernos Negros: autoria e representações. Belo Horizonte: Programa de Pós-Graduaçao em Letras/Estudos Literários, Universidade Federal de Minas Gerais/Faculdade de Letras, 2009. (Dissertação de Mestrado). In: ALVES, Miriam. BrasilAfro Autorrevelado – literatura brasileira contemporânea. Belo Horizonte: Nandyala, 2010.


SEMOG, Éle. Tudo que está solto. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2010.

VIEIRA, Lia. Só as mulheres sangram. Belo Horizonte: Nandyala, 2011.
hooks, bell. “Vivendo de amor”. IN: WERNECK, Jurema; MENDONÇA, Maysa; EVELYN C. (Org.). O livro da saúde das mulheres negras: nossos passos vêm de longe. Rio de Janeiro: Pallas Editora / Criola, 2006. IN: FELISBERTO, Fernanda. (Escre)vivências na Diáspora: escritoras negras, produção editorial e suas escolhas afetivas. Uma leitura de Carolina Maria de Jesus, Conceição Evaristo, Maya Angelou e Zora Neale Hurston. Rio de Janeiro: Programa de Pós-Graduação em Letras/Literatura Comparada, Universidade Estadual do Rio de Janeiro/Faculdade de Letras, 2011. (Tese de Doutorado)

domingo, 16 de outubro de 2011

Oráfrica: revista de oralidad africana - CONVOCATÓRIA PARA ARTIGOS

Oráfrica: revista de oralidad africana - CONVOCATÓRIA PARA ARTIGOS


Encontra-se em preparação a publicação do número 8 da revista ORÁFRICA: REVISTA DE ORALIDAD AFRICANA, pelo que convidamos os professores, investigadores e outras pessoas interessadas a redigir artigos relacionados com qualquer aspeto oral das culturas africanas, assim como recensões bibliográficas sobre o mesmo tema. A publicação da revista está prevista para Abril de 2012. Os artigos deverão ser enviados sob forma eletrónica para o endereço orafrica@ceiba.cat antes de 31 de Dezembro de 2011.
Os textos deverão ser apresentados em formato Word, utilizando preferentemente o tipo de letra Times New Roman de tamanho 11, com espaçamento simples e texto justificado sem indentações.
Na primeira página, deverá ser incluído o nome do autor (tal como quer que conste), o título do artigo e a instituição (ou a menção que queira fazer constar).
Deverá ser enviado igualmente um resumo do artigo (máximo 10 linhas) iniciado por uma breve apresentação do autor (2 linhas), em espanhol e em inglês.
A extensão máxima dos artigos é de 25 páginas.
As recensões bibliográficas seguem os mesmos critérios formais. Não deverão incluir notas e a sua extensão máxima é de 3 páginas.
A revista ORÁFRICA publica-se em catalão, espanhol, francês, inglês e português. Os artigos apresentados em outras línguas serão traduzidos livremente pelo conselho editorial da revista.

CALL FOR PAPERS
We are preparing the number 8 of the Review Orafrica: Revista de Oralidad Africana and we want to invite to professors, lecturers, researchers and other persons to write articles about any oral subject of African cultures and also critics of recent books published. The publication of the number 3 will be in April of 2012. The articles must be sent by internet to the electronic address orafrica@ceiba.cat before 31 of December of 2011.
The articles must be presented in Word, using Times New Roman 11 points, with simple interlineal, text justified, and no indentation.
In the page of the title must appear the name of the author, the title of the article, and the Institution.
Must be sent too an abstract of the article (10 lines) and a brief presentation of the author (2 lines), in Spanish and English.
The maximum extension of the articles is 25 pages.
The critics of bibliography must be the same criteria. They cannot incorporate footnotes. The maximum extension is 3 pages.
Orafrica is published in Catalan, Spanish, French, Portuguese and English. The articles presented in other languages will be translated freely by the Review.

APPEL À COLLABORATION
En prévision de la publication du nº 8 de la revue ORÁFRICA : REVISTA DE ORALIDAD AFRICANA, nous invitons aux professeurs, chercheurs et autres personnes intéressées à rédiger des articles en rapport avec tout aspect oral des cultures africaines, ainsi qu’à rédiger des recensions bibliographiques du même sujet. La publication de la revue est prévue pour le mois d’avril 2012. Les articles doivent être envoyés par voie télématique à notre direction électronique (orafrica@ceiba.cat) avant le 31 décembre 2011.
Les textes doivent être présentés en format Word, en utilisant, de préférence, Times New Roman de 11 pt., avec interligne simple.
Il faut ajouter, dans la page du titre, le nom de l’auteur (de la façon dont on veut qu’il apparaisse), le titre de l’article et l’Institution d’origine (ou la mention que l’on veuille faire figurer).
Il faut ajouter aussi un bref résumé de l’article (10 lignes) entamé par une brève présentation de l’auteur (2 lignes), en Espagnol et en Anglais.
L’extension maximale des articles est de 25 pages.
Les recensions bibliographiques suivront les mêmes critères formels. Celles-ci ne doivent pas porter des notes, et son extension maximale sera de 3 pages.
ORÁFRICA est publiée en Catalan, Espagnol, Français, Anglais et Portugais. Les articles présentés dans d’autres langues seront librement traduits par la revue.

CONVOCATORIA PARA LA PUBLICACIÓN DE ARTÍCULOS
En previsión de la publicación del número 8 de la revista ORÁFRICA: REVISTA DE ORALIDAD AFRICANA, invitamos a los profesores, investigadores y otras personas interesadas a redactar artículos relacionados con cualquier aspecto oral de las culturas africanas, así como recensiones bibliográficas del mismo tema. La publicación de la revista está prevista para el mes de abril de 2012. Los artículos deben enviarse por vía telemática a la dirección electrónica orafrica@ceiba.cat antes del 31 de diciembre de 2011.
Los textos deben presentarse en formato Word, utilizando preferentemente el tipo de letra Times New Roman de 11 pt., con interlineado sencillo y texto justificado y sin sangrías.
En la página de título debe constar el nombre del autor (tal como se quiere que conste, el título del artículo y la Institución de origen (o la mención que se quiera hacer constar).
Se adjuntará un breve resumen del artículo (10 líneas) iniciado por una breve presentación del autor (2 líneas), en español y en inglés.
La extensión máxima de los artículos es de 25 páginas.
Las recensiones bibliográficas seguirán los mismos criterios formales. No deben llevar notas, y su extensión máxima será de 3 páginas.
ORÁFRICA se publica en catalán, español, francés, inglés y portugués. Los artículos presentados en otras lenguas serán traducidos libremente por la revista.

Fonte: Dá Fala

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Elio Ferreira: Literatura Afrodescendente (livro)

 

Professores do curso de Letras/Português lançam livro na sexta-feira(14)

Os professores doutores Algemira de Macedo Mendes e Élio Ferreira, do Curso de Letras/Português, do Campus Poeta Torquato Neto, da Universidade Estadual do Piauí (UESPI) lançarão, no dia 14 de outubro, a partir das 19h, na livraria Entrelivros, localizada na Avenida Dom Severino, Nº 1045, bairro Jockey Clube, zona Leste de Teresina, o livro “Literatura Afrodescendente: memória e construção de identidades. A obra reúne 16 artigos de escritores de todo o Brasil, apresentados por meio de comunicações, durante o Simpósio “Literatura Afrodescentente: memória e construção de identidades”.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

www.lopesfilho.com - sítio do Dr. João Lopes Filho

Com imensa satisfação que publico este texto a respeito de um novo sítio de extremo interesse para os estudiosos da cultura cabo-verdiana:  www.lopesfilho.com - do Prof. Dr. João Lopes Filho.

Nascido na ilha de São Nicolau, Cabo Verde, o sítio do Dr. Lopes Filho oferece textos críticos, a bibliografia completa, um fórum para discussão, entre outras informações.

A seguir, alguns títulos de Lopes Filho, os meus votos de sucesso para sítio tão importante e meus agradecimentos ao Prof. Dr. João Lopes Filho por divulgá-lo neste espaço.
Ricardo Riso


Cabo Verde - Apontamentos Etnográficos, Lisboa, Ed. do Autor, 1976
Estória, Estória... Contos Cabo-Verdianos, Lisboa, Ulmeiro, 1978 (2ª ed. - 1983, Edição em inglês - 1995).
Cabo Verde - Subsídios para um Levantamento Cultural, Lisboa, Plátano Editora, 1981.
Contribuição para o Estudo da Cultura Cabo-verdiana, Lisboa, Ulmeiro, 1984.
Defesa do Património Sócio-Cultural de Cabo Verde, Lisboa, Ulmeiro, 1985.
A Comunidade Cabo-Verdiana em Portugal (co-autor), Lisboa, I.E.D., 1992.
Cabo Verde. Retalhos do Quotidiano, Lisboa, Caminho, 1995.
Ilha de S. Nicolau de Cabo Verde. Formação da Sociedade e mudança cultural, (2 vols.), Lisboa, Ministério da Educação, 1996.
O Corpo e o Pão. O Vestuário e o Regime Alimentar Cabo-verdianos, Oeiras, Câmara Municipal de Oeiras, 1997.
Vozes da Cultura Cabo-verdiana, Lisboa, Ulmeiro, 1998.
O Forte do Príncipe Real e a Defesa da Ilha de S. Nicolau, Cascais, Edições Património, 1998.
Olhares Partilhados, Praia, Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 2002.
Introdução à Cultura Cabo-Verdiana, Praia, Instituto Superior de Educação, 2003.
Subsídios para o estudo da abolição da escravatura, Praia, Spleen, 2006.
Imigrantes em Terra de Emigrantes, Praia, Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 2007.
In Memoriam João Lopes, Praia, Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro.2007.
Crónicas do Tempo que Passou, Praia, Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 2009.
Percursos & Destinos, Luanda, União de Escritores Angolanos / Sonangol, 2010

João Tala - “Conto os meus mortos e revejo as cicatrizes” (entrevista)

“Conto os meus mortos e revejo as cicatrizes”

O poeta e ficcionista João Tala lançou, recentemente, na União dos Escritores Angolanos, o livro de contos “Rosas & Munhungo”. Tala é autor dos livros “A Forma dos Desejos”, poesia, prémio Primeiro Livro da UEA, 1997, “O Gasto da Semente”, poesia, menção honrosa do Prémio Sagrada Esperança do INALD, 2000, “A forma dos Desejos II”, Chá de Caxinde, 2003, “Lugar Assim”, poesia, UEA, 2004, “Os Dias e os Tumultos”, contos, Grande Prémio de Ficção da UEA, 2004, “A Vitória é Uma Ilusão de Filósofos e de Loucos”, Grande Prémio de Poesia da UEA, 2005, “Surreambulando”, contos, UEA, 2007, e “Forno Feminino”, poesia, Kilombelombe, 2009.

Isaquiel Cori, 09 de outubro de 2011

Vida Cultural - Cada conto refere-se a uma mulher. São curtas mas grandes estórias de amor. Amores vividos ou sonhados?
João Tala - As personagens principais dos contos em Rosas & Munhungo são mulheres distintas que vivem diversas situações, ou são reconhecidas num cenário do pós-guerra imediato. Um traço comum entre essas mulheres é a superação de traumas e outros estados psicológicos daí decorrentes, pelo amor. A característica estilística tem uma grande carga onírica onde o real vivido se revê na composição do sonho.
VC - O título "Rosas & Munhungo" sugere amor e boemia. Quer comentar?
JT - Rosas, como sendo flores, é simbologia feminina, portanto, associada à mulher. Essas personagens, a maioria delas, adaptaram-se a ambientes que lhes eram hostis, ou então a carência cede-lhes o argumento para “ir à rua”. Daí a expressão kimbundo munhungo que é sinónimo de libertinagem, num sentido mais ousado da boemia.

Foto: Jornal de Angola
VC - A proveniência médica do autor está muito presente pelo uso notório de termos do jargão médico. Este uso é propositado ou decorre, digamos, de deformação profissional?
JT - Deformação profissional e porque a personagem representa gente. A essência da medicina são as pessoas.
VC - No estrito sentido do texto pressentem-se algumas ressonâncias intertextuais que fazem lembrar o argentino Jorge Luis Borges, o moçambicano Mia Couto, o angolano Boaventura Cardoso e mais remotamente o também angolano Luandino Vieira. Assume essas influências?
JT - Leio muitos escritores. Mas, no interesse da minha escrita, são os latino-americanos que mais me inspiram. Começou, esse interesse, com a leitura da colecção “Vozes da América Latina” que o nosso INALD dava à estampa nos primórdios de 80 do século passado, principalmente quando li “Pedro Páramo”, de Juan Rulfo. Seguiram-se depois “O Trovão entre Folhas”, de Roa Bastos, os livros de Gabriel Garcia Marques, entre outros. Do Boaventura Cardoso fascinou-me mais “A Morte do Velho Kipacaça”. Já Luandino Vieira e Mia Couto, salvas as diferenças, parecem enquadrados dentro da mesma dinâmica de reinvenção que a mim fascina, mas não creio que perceba na minha escrita esse modo de conceber o texto. Borges é uma leitura mais recente.
VC - Desde “A Forma dos Desejos I” a mulher tem um lugar muito especial nas suas obras. É seu propósito constante homenagear a mulher? As mulheres tiveram ou têm um papel determinante na sua vida?
JT - Esclarecer sobre isto seria mais do domínio da psicanálise, já que é quase uma constante também na minha poesia. Evidentemente, não vou passar o filme da minha infância e flagrar o papel delas no meu “esquecimento”. Fica para depois.
VC - O contar recorrente de estórias e histórias humanas do tempo da guerra faz parte dos seus livros? Acredita que isso faz falta à reconciliação nacional?
JT - Não o faço pela reconciliação. Faço-o pelo hábito de contar. O militar que conte os cartuchos e o que ainda resta para esmagar. Eu conto os meus mortos, revejo as cicatrizes, teço sonhos, amo e amargo-me. Não fui voluntário quando um dia me cangaram para a tropa onde eu conviviria mais de perto com a guerra. Isso assim, é também matéria para poesia. Escrevo sobre aquilo que vivi e o que me está mais próximo é a guerra. Se analisar bem, saberá que só falta aos políticos reconciliarem-se e deixarem de arrastar os militantes dos partidos nas suas paranóias. De resto, nem a Bíblia reconciliaria. Por exemplo, não acredito que o malanjino não se dê bem com um bieno ou que um bakongo seja inimigo de um umbundo. Só entre militantes de uns e de outros é que se destilam ódios. É maka deles, os políticos.
VC - Sendo um dos autores mais premiados no país, a sua obra não deveria ter uma maior divulgação em Angola e no estrangeiro?
JT - Para tal, falta ao João Tala a cunha. Dizem que isso se faz com a imprensa e com agregação a grupos privilegiados. São coisas de acontecer.
VC - O que o faz escrever? O que o move enquanto escritor?
JT - A leitura. Eu leio mais do que escrevo e isso me inspira, insufla no meu cérebro imagens que persigo no acto da escrita. Depois há o hábito de contar, há a beleza da poesia.
VC - Na qualidade de poeta, que avaliação faz do legado poético de Agostinho Neto?
JT - Posta a pergunta em termos de “legado” fica difícil responder. Agostinho Neto concebeu belas criações poéticas, com um simbolismo que se remetia aos conteúdos da sua época, com plena satisfação estética. No seu tempo o neo-realismo fazia escola com preocupações que tinham no centro a vida simples dos homens mais simples. E no seu caso, a sua terra então colonizada e oprimida, estava no centro das suas inquietações.
VC - A literatura angolana está robusta? Vê nela sinais de renovação?
JT - A geração à qual pertenço, iniciou nos anos 80 uma movimentação que daria em fartos acontecimentos literários. Essa inspiração colectivista, depois que o tempo fez a sua natural selecção, permite hoje distinguir a maturidade dos que jamais se despojaram do interesse pelo estudo e trabalho. Sim, essa literatura está mais robusta. Quanto aos sintomas de renovação ou inovação costumam estar mais associados ao desempenho universal da literatura. Somos apenas peças dessa grande engrenagem, cada um contribuindo para o produto final. Só o génio é outra coisa.



Dia das Crianças na Kitabu - Livraria Negra

domingo, 9 de outubro de 2011

Literatura e Afrodescendência no Brasil: antologia crítica - Eduardo de Assis Duarte (org.)


Literatura e Afrodescendência no Brasil: antologia crítica
Eduardo de Assis Duarte (org.)
Coleção: Humanitas
2011. ISBN: 978-85-7041-904-0

Composto de quatro volumes, Literatura e afrodescendência no Brasil é fruto de pesquisa realizada em todas as regiões do país com vistas ao mapeamento e estudo da literatura produzida pelos afrodescendentes desde o período colonial. Esta antologia crítica envolveu 61 pesquisadores, vinculados a 21 instituições de ensino superior brasileiras e seis estrangeiras. O resultado apresenta a faceta afro da literatura brasileira, num total de 100 escritores oriundos de tempos e espaços diversos, apresentados a partir de ensaios críticos, contendo dados biográficos, estudo de obra, relação de publicações e de fontes de consulta.

Precursores – volume 1 - 583 páginas
É dedicado aos autores afrodescendentes nascidos antes de 1930. Cobre um amplo painel que se inicia no século XVIII com Domingos Caldas Barbosa, passa por Luiz Gama e Maria Firmina dos Reis, com suas obras pioneiras em meados do século XIX, chega a Machado de Assis, José do Patrocínio, Cruz e Sousa, Lima Barreto e abarca ainda autores do século XX, tais como Nascimento Moraes, Lino Guedes, Solano Trindade, Abdias Nascimento, Carolina Maria de Jesus, Mestre Didi, Eduardo de Oliveira e Carlos de Assumpção.

Consolidação - volume 2 - 441 páginas
O segundo volume se inicia com o poeta e ficcionista Oswaldo de Camargo e trata de escritores nascidos nas décadas de 1930 e 1940, entre eles Joel Rufino dos Santos, Nei Lopes, Muniz Sodré, Conceição Evaristo, Adão Ventura, Paulo Colina, Oliveira Silveira, Domício Proença Filho, Geni Mariano Guimarães e Arnaldo Xavier. Aborda ainda o memorialismo angustiado de Francisca Souza da Silva, em sua perambulação pelas cozinhas, ruas e favelas brasileiras.

Contemporaneidade – volume 3 - 565 páginas
Apresenta ensaio de Maria Nazareth Soares Fonseca sobre Cuti – poeta, ficcionista, um dos fundadores da série Cadernos Negros – e abarca um conjunto de 39 escritores nascidos na segunda metade do século XX: Miriam Alves, Edimilson de Almeida Pereira, Esmeralda Ribeiro, Salgado Maranhão, Éle Semog, Lia Vieira, Márcio Barbosa, Ronald Augusto, Paulo Lins, Ana Maria Gonçalves, José Carlos Limeira e Jônatas Conceição, entre outros.

História, teoria, polêmica – volume 4 - 419 páginas
Eduardo de Assis Duarte e Maria Nazareth Soares Fonseca (org.)
Contempla reflexões sobre o projeto de uma literatura negra ou afro-brasileira a partir de visões diferenciadas e contrastantes. Traz depoimentos dos escritores Abdias Nascimento, Oswaldo de Camargo, Cuti, Conceição Evaristo, Márcio Barbosa e Esmeralda Ribeiro, empenhados na construção dessa vertente. Além disso, apresenta textos críticos de Octávio Ianni, Silviano Santiago, Zilá Bernd, Leda Maria Martins, Zahidé Muzart, Maria Nazareth Soares Fonseca, Eduardo de Assis Duarte, Regina Dalcastagnè e Marcos Antônio Alexandre.

Twitter: @editoraufmg


OPINIÃO DO BLOG:
É com imensa satisfação que contribuo para a divulgação desta antologia, de extrema necessidade para uma vertente ainda pouco conhecida da literatura brasileira. Parabéns ao Prof. Dr. Eduardo de Assis Duarte por coordenar uma numerosa equipe de pesquisadores e as congratulações a todos que participaram deste projeto. Desde já, o maior e mais importante título literário do século XXI. Leitura mais que recomendável!
Ricardo Riso

Fonte: e-mail gentilmente enviado pelo Prof. Dr. Amarino Queiroz em 9 de outubro de 2011.

II Encontro Internacional de Literaturas, Histórias e Culturas Afro-Brasileiras e Africanas – NEPA/UESPI

INSCRIÇÕES PRORROGADAS ATÉ 30 DE OUTUBRO!

Encontro internacional de literatura africana e afro-brasileira abre inscrições - PI


O evento será realizado de 15 a 18 de novembro no Campus Poeta Torquato Neto

O Núcleo de Estudos e Pesquisas Afro, do Centro de Ciências Humanas e Letras (NEPA/CCHL), da Universidade Estadual do Piauí (Uespi), receberá até o dia 30 de outubro de 2011, por meio do site http://nepauespi.wordpress.com/ , as inscrições referentes ao II Encontro Internacional de Literaturas, Histórias e Culturas Afro-Brasileiras e Africanas – ÁFRICA BRASIL, que será realizado pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas Afro – NEPA e o Mestrado Acadêmico da Uespi. O evento será realizado em Teresina – Piauí, de 15 a 18 de novembro de 2011, no Campus Poeta Torquato Neto.

O encontro terá o objetivo de reunir pesquisadores do Brasil e de países africanos em torno do debate sobre a Literatura, a História e a Cultura de matriz africana, trazendo à tona o discurso pós-colonial dos povos da Diáspora. Mesas-redondas, conferências, minicursos, comunicações e simpósios temáticos serão as formas a partir das quais direcionaremos os debates propostos pela temática desse evento: memória e construções literárias. A programação é formada por minicursos, mesas-redondas, conferências, comunicações, lançamento de livros e atividades culturais.

As atividades acadêmicas serão abertas pelo Prof. Dr. Eduardo Assis Duarte, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que falará sobre “Literatura Afro-Brasileira”. Em outra conferência, o Prof. Dr. Henrique Cunha Júnior, da Universidade Federal do Ceará (UFC), discorrerá sobre “Os africanos escravizados no Brasil sabiam ler: aportes da história africana para a história brasileira”. O Prof. Dr. Múleka Dítoka Wa Kalenga, da República Democrática do Congo, encerrará a sequência de conferências ministrando: “A Cibernética e equação dos búzios: do Egito à Contemporaneidade”.

As mesas-redondas prometem discussões sobre diversas temáticas que dizem respeito à literatura africana e afro-brasileira, por exemplo: “Religiões Negras e Indígenas no Piauí”, a ser debatida pelos professores: Prof. Dr. Solimas Lima (UFPI), Prof. Dr. Alcebíades Costa Filho (Uespi), Profa. Dra. Claudete Dias (UFPI), Prof. Dr. João Júnior – (Uespi), Profa. Dra. Algemira de Macedo Mendes (Uespi) e Profa. MSc. Assunção de Maria Sousa e Silva (Uespi).

O Prof. Dr. Élio Ferreira, da comissão organizadora, informa que o evento é aberto a todos da sociedade que estudam a temática. Ele lembra, ainda, que as vagas são limitadas, principalmente as referentes aos minicursos. “Os interessados precisam se inscrever o quanto antes. Todas as participações terão direito a certificação emitida pela Pró-Reitoria de Extensão da Uespi”, afirma o professor.
 
FONTE: http://fazervaleralei.blogspot.com/

"VII Semana de Educação da Pertença Afro-Brasileira: educação, relações étnicas e gênero - UESB

"VII Semana de Educação da Pertença Afro-Brasileira: educação, relações étnicas e gênero"
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia- UESB, Campus de Jequié-Bahia.
16 a 19 de novembro de 2011

Inscrições com trabalho prorrogadas até 18 de outubro



A VII Semana de Educação da Pertença Afro-Brasileira: educação, relações étnicas e gênero, acontecerá na cidade de Jequié-BA e terá como participantes: pesquisadores(as); docentes e discentes da educação básica e superior; profissionais da área de educação, saúde, direitos humanos e assistência social; movimento social e ONGs; associações de moradores e demais interessados(as). O propósito do evento é apresentar e debater aspectos relacionados às temáticas educação, etnicidade e gênero a fim de que os(as) participantes possam repensar em suas visões equivocadas e discriminatórias no que diz respeito às culturas afro-brasileiras e indígenas, revendo seus olhares eurocêntricos e monoculturais, além disso é intuito da semana, a divulgação de resultados de trabalhos oriundos de pesquisa e de extensão e que estejam atrelados às temáticas em questão. O evento contará com variadas atividades, quais sejam: conferências, palestras, mesas-redondas, oficinas, mini-cursos, apresentação de trabalhos, mostras de vídeos e fotografias, sessão de pôsteres e apresentações artísticas. Espera-se com este evento contribuir para que os(as) participantes possam modificar suas atitudes e práticas educativas em prol de uma sociedade reconhecedora e respeitosa da diversidade cultural, étnica e de gênero.

As inscrições estão abertas para trabalhos, mini-cursos, mesas -redondas, mostras fotográficas e de vídeos nos seguintes GT's:


GT1 - Educação, Relações Étnicas e Legado Africano
GT2 - Diversidade Linguística, Literatura e Linguagem
GT3- Etnociência e Diversidade Cultural
GT4- Saúde da População Negra
GT5- Saberes e Práticas Educativas: Terreiros e Quilombos
GT6- Linguagens Visuais e Culturas
GT7- Artes, Manifestações Culturais, Moda e Corpo
GT8- Políticas de Ações Afirmativas e Movimentos Sociais
GT9- Populações Negras: Gênero e Homoafetividades
GT10- Construção Cultural dos Povos Indígenas Brasileiros: Territorialidades, Histórias, Culturas, Saberes e Educação Escolar Indígena
GT11- História da África e Experiências na Diáspora.

Segue abaixo o link:
http://www.odeeresemana.webcindario.com/index.htm

Seminário de Reflexão e Memória da Cultura Afrobrasileira - PUC/RJ

Envio de Resumos - Seminário de Reflexão e Memória da Cultura Afrobrasileira - Até o dia 10/10/2011


O prazo para para submissão de resumos a serem apresentados nos Grupos de Trabalho GT's) do Seminário de Reflexão e Memória da Cultura Afrobrasileira a ser realizado nos dias 08 e 09 de novembro de 2011, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). O tema deste ano será “O Ano Internacional dos Afrodescendentes e a Resistência Política dos Negros no Brasil de Zumbi dos Palmares a Abdias Nascimento”.

Maiores informações através do endereço: http://seminarioafro2011pucrio.blogspot.com/

As inscrições são gratuitas!
Prazo para submissão de resumos até o dia 10/10/11
Divulgação do Resultado dos Trabalhos Aprovados: 15/10/11

Ementa dos Grupos de Trabalho:

GT1 - Políticas Públicas e Questão Racial
Coordenadora: Profa. Ms. Ana Helena Passos (Doutoranda PPGSS PUC-Rio)
O profundo processo de transformação pelo qual o Brasil redemocratizado vem passando engloba uma séria de políticas públicas voltadas para promoção de igualdade racial. Tais políticas estão intimamente ligadas ao legado e à luta diária, no presente, dos movimentos sociais negros. Como acentua o sociólogo Antonio Sérgio Guimarães é a partir de uma bandeira unificada pela luta de combate ao racismo que os movimentos negros trazem para cena brasileira atual uma agenda que alia política de reconhecimento (de diferenças raciais e culturais), política de identidade (racialismo e voto étnico), política de cidadania (combate à discriminação racial e afirmação dos direitos civis dos negros) e política redistributiva (ações afirmativas ou compensatórias). É no sentido de entender e problematizar essas políticas que se enquadra nosso Grupo de Trabalho.

Dito isso, o objetivo deste grupo está em acolher e conjugar as mais diversas produções de conhecimento e intervenções que tratem desta temática bem como discutir as políticas públicas já implementadas pelas distintas esferas do Governo brasileiro no desejo de promover um diálogo que segue de encontro com as agendas políticas envolvidas com a busca por promoção de igualdade e pela luta antirracista.

GT2 - Educação das relações étnico-raciais: a lei 10.639/2003
Profa. Ms. Antonia Ceva (REDEH / Doutoranda PPGSS PUC-Rio)
A Lei nº 10.639/03 insere a temática da História e da Cultura Afrobrasileira e Africana no currículo das instituições oficiais de ensino. É uma Lei Federal, ou seja, contempla todo o território brasileiro e é obrigatória, tendo em vista resgatar a história e a memória dos povos africanos escravizados no Brasil. Para tanto, a proposta é enfatizar a luta dos negros e das mulheres negras, bem como a resistência do período da escravidão, destacando lideranças deste período e da pós-emancipação. Nossa proposta com este GT é discutir o alcance e os limites da Lei 10.639/03, tendo em vista que o mito da democracia racial (um dos grandes entraves da luta contra o racismo) se encontra presente no imaginário da população brasileira, sobretudo, nos livros didáticos e, também, trazer expeirências concretas de implementação da Lei 10.639/03 nas insituições de ensino superior e na educação básica.

GT3 - Racismo Institucional e Sistemas de Justiça
Coordenador: Prof. Ms. Ilzver Matos de Oliveira (UNIT / Doutorando PPGD PUC-Rio)
O Grupo de Trabalho busca promover intercâmbios entre pesquisadores e militantes sociais de diversas áreas do conhecimento, que discutem e refletem nos seus trabalhos sobre o conceito de Racismo Institucional e sobre as estratégias de percepção e superação das práticas institucionais racistas reproduzidas naturalmente ao longo dos séculos, notadamente dentro do Sistema de Justiça brasileiro (Delegacias, Ministério Público, Tribunais, entre outros). Neste sentido, o presente GT objetiva reunir trabalhos científicos que possam traçar um panorama desse debate no Brasil e que contribuam para a construção de novas práticas institucionais, sintonizadas com a necessidade de se reconhecer o racismo como um dos problemas mais graves, persistentes e desumanizantes no nosso país e com o dever de se promover mecanismos de garantia dos direitos étnicos-raciais no Brasil.

GT4 - Patrimônio, Territórios e Memória Afrobrasileira: processos identitários contemporâneos
Coordenadora: Profa. Ms. Lady Christina de Almeida (NIREMA PUC-Rio)
O presente GT busca compreender as novas relações estabelecidas entre território, memória, identidade e patrimônio advindos das novas dinâmicas na contemporaneidade, no momento em que a identidade torna-se instrumento de ação política, apropriada pelos movimentos sociais que utilizam esse discurso como estratégia para obtenção de conquistas políticas e sociais efetivas e reconhecimento institucional na formulação de políticas de identidade. Assim, como a construção e fortalecimento das identidades contribuem para reconstrução da memória e para ressignificações de território e patrimônio? Neste GT pretendemos reunir trabalhos e discussões que tratam a memória sobre suas várias dimensões, que reflitam sobre o patrimônio como imagens construídas em modalidades de expressão escritas, além de visuais e espaciais. Buscamos aqui também entender as narrativas acerca dos movimentos, das territorialidades como experiências que demarcam a legitimidade do passado re-contado no presente como justificativa de sua existência e afirmação de identidades e suas relações com o poder.

GT5 - Gênero, Raça e Sexualidade
Coordenadora: Profa. Ms. Vanessa do Canto (Doutoranda do PPGD PUC-Rio)
Nos últimos anos, as pesquisas sobre gênero, raça e sexualidade têm sido ampliadas sob a perspectiva da interseccionalidade que se constitui em um conceito importante para as investigações críticas sobre as múltiplas formas de produção e manifestação da subjetividade nas sociedades contemporâneas. No Brasil, tem sido útil para a compreensão das peculiaridades relativas às formas de manifestação do racismo e seus efeitos agravados quando aliados à discriminações baseadas no gênero e na sexualidade. Neste sentido, o presente Grupo de Trabalho tem por objetivo constituir um espaço de interlocuções interdisciplinares no qual possam ser compartilhadas as reflexões oriundas de pesquisas relacionadas à ação política feminista e dos movimentos de mulheres, bem como sobre políticas públicas que tenham por finalidade o enfrentamento das desigualdades decorrentes de discriminações baseadas no gênero, raça e/ou sexualidade nos diferentes espaços da sociedade. Dessa forma, serão bem vindos trabalhos ligados a distintas correntes teóricas que permitam ampliar e aprofundar os debates sobre os temas propostos.

GT6 - Religiosidade Afrobrasileira e Intolerância Religiosa
Coordenadora: Mãe Flávia Pinto (Casa do Perdão)

GT7 - Racismo, Multiculturalismo e Reconhecimento
Coordenadora: Profa. Ms. Thula Pires (PUC-Rio)
O Grupo de Trabalho Racismo, Multiculturalismo e Reconhecimento pretende acolher as reflexões e críticas de pesquisadores, pesquisadoras e ativistas que enfrentam o racismo, nas suas mais variadas formas de expressão, a partir do referencial teórico da Teoria do Reconhecimento e do Multiculturalismo. As demandas por respeito, além de redefinirem os papéis na seara econômica e política, permitem, ainda, redimensionar a importância simbólica das tradições e da cultura negra no Brasil. Busca-se, primordialmente, debater a racialização da sociedade brasileira e do sistema de privilégios decorrentes de sua naturalização a partir do enfrentamento das conseqüências do falso reconhecimento ou da sua total ausência na conformação das Identidades.

Realização:
PUC-Rio

Apoio:
Centro de Ciências Sociais
Departamento de Direito
(Núcleo de Estudos Constitucionais e Núcleo de Direitos Humanos)
Departamento de Serviço Social
Núcleo Interdisciplinar de Reflexão e Memória Afrodescendente (NIREMA)
Comissão Organizadora:
Profa. Ms. Thula Pires (PUC-Rio)
Vanessa do Canto (Doutoranda do PPGD PUC-Rio)

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Cabo Verde em Xique-Xique (Bahia, Brasil)



Cabo Verde em Xique-Xique, Bahia
Ricardo Riso
Resenha publicada no semanário cabo-verdiano A Nação, n. 214, de 06/10/2010, p. 42
Intensa tem sido a presença da literatura cabo-verdiana no Brasil, com eventos recentes envolvendo as letras do arquipélago em três estados: Bahia, São Paulo e Rio de Janeiro. A 587 km de Salvador, capital da Bahia, às margens do rio São Francisco, Xique-Xique recebeu, de 21 a 24 de setembro, o II Xirê das Letras – Giros de Resistência – Congresso Internacional de Línguas, Literaturas e Culturas Africanas e Afro-Americanas no campus DCHT XXIV, da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), sob a organização do Prof. Ms. João Silva Rocha Filho e da Profª Ms. Lise Mary Arruda Dourado.
A diversidade foi a tônica do II Xirê das Letras, as palestras abordavam literatura, história, religiosidades afro-brasileiras, ações afirmativas, discriminação, entre outros áreas de interesse, demonstrando as experiências de pesquisadores de várias partes do país. As mesas de comunicação e os minicursos também seguiram o caráter heterogêneo do Congresso.
Cabo Verde marcou presença com a participação, em duas mesas, do sempre cativante escritor e cronista Filinto Elísio; na primeira, a fala emocionada em razão da morte de Aristides Pereira; para além dessa triste passagem, Elísio comoveu a plateia ao mencionar a entrada dos afro-descendentes nas universidades, deslocando-se de objetos de estudos para sujeitos do discurso, sendo a Educação a nova arma na guerra de libertação travada nos estudos acadêmicos.
O outro momento cabo-verdiano concretizou-se com a presença de Joaquim Arena, jovem escritor radicado em Portugal que lançou recentemente o romance “Para onde voam as tartarugas” (Caminho – Portugal). Feliz com a sua primeira vinda ao Brasil, Arena aproveitou para mencionar semelhanças entre Brasil e Cabo Verde, tanto na música quanto na literatura, pois esta última influenciou a sua escrita.
Eu, a convite da Profª Lise Arruda, participei da subcomissão de comunicações, indiquei nomes de autores africanos e ministrei o minicurso “Novas Tendências da Literatura Cabo-Verdiana (escritores heterônimos de si próprios)”. Em dois dias, com quatro horas de duração, o objetivo era mostrar o pluralismo estético-ideológico e a diversidade temática no pós-independência presentes na prosa e na poesia com auxílio de eixos temáticos, tais como Poesia de indagação ontológica e metafísica, Poesia desassombrada da monocultura identitária e Poesia Diaspórica. No último dia, Joaquim Arena e Filinto Elísio abrilhantaram o curso com suas participações e informações pertinentes acerca do panorama contemporâneo da literatura de Cabo Verde.
Para finalizar, houve a comunicação da colega Ruth Maria Chaves Pires a partir do poema “Banquete”, de Filinto Elísio. Aproveito para deixar o meu sincero agradecimento aos organizadores supracitados e demais agentes que construíram tão belo Congresso. O Xirê (roda) fomentou ideias, cativou corações e mentes.
Enquanto isso, na Faculdade de Letras da USP, a presença cabo-verdiana tem sido uma constante no departamento coordenado pela Profª Drª Simone Caputo Gomes. Em abril, Mito Elias apresentou “Tempo de Bichos: celebrando as 70 vidas do poeta Arménio Vieira”, estendida ao Museu Afro-Brasil; em agosto, a escritora e jurista Vera Duarte falou para mais de 200 alunos de Literatura Cabo-Verdiana, para além de pós-graduandos e professores da área. Duarte, no mesmo mês, esteve ao lado de Conceição Evaristo (Brasil), de Odete Semedo (Guiné-Bissau) e de Sonia Sulthuane (Moçambique) no evento “4 vozes femininas de África”, na UFRJ, sob coordenação da Profª Drª Carmen Lucia Tindó Secco. Nos dias 19 e 20 deste, Corsino Fortes e Filinto Elísio discorreram sobre suas obras também na USP. Os dois vates ainda apresentaram-se na prestigiada Casa das Rosas (Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura), dia 20, em São Paulo.
É assinalável a aproximação de Brasil e Cabo Verde no campo literário. Desejo que esses eventos se tornem frequentes por aqui e contribuam para a popularização das letras do arquipélago. É a minha utopia.