terça-feira, 27 de maio de 2008

João Melo: críticas ácidas à sociedade angolana contemporânea em "The serial killer e outros contos risíveis ou talvez não"

Por Ricardo Riso


João Melo nasceu em Luanda, em 1955, formou-se em Direito e Comunicação Social. É membro fundador da UEA - União dos Escritores Angolanos. Jornalista profissional e deputado na Assembléia Legislativa em Angola.

Representante da “geração das incertezas”, expressão alcunhada por Luis Kandjimbo, começou sua trajetória literária na poesia, nos anos 1980, tendo lançado sete livros: Definição (1985), Fabulema (1986), Poemas Angolanos (1989), Tanto Amor (1989), Canção do Nosso Tempo (1991), O Caçador de Nuvens (1993), Limites e Redundâncias (1997). Posteriormente, dedica-se ao conto, constando quatro publicações no seu currículo: Imitação de Sartre e Simone de Beauvoir (1998), The Serial Killer e outros contos risíveis ou talvez não (2000), Filhos da Pátria (2001), O dia em que o Pato Donaldo comeu pela primeira vez a Margarida (2006); e na área de ensaios, Jornalismo e política (1991).

O livro The Serial Killer e outros contos risíveis ou talvez não reúne dezessete contos, com temas diversificados acerca da atual sociedade angolana. João Melo, detentor de uma escrita corrosiva, utiliza um narrador implacável com os hábitos da nova burguesia angolana. Sua indignação é tão intensa que apela com freqüência para expressões vulgares e agressivas ao tecer comentários que vão da ironia ao sarcasmo, em situações geralmente inusitadas do cotidiano da cidade de Luanda, capital de Angola. Contudo, suas histórias não se restringem a Luanda, expandem-se pelo interior do país e em outros continentes.

Deve-se salientar o sopro de renovação proporcionado pelos contos de The Serial Killer... no corpo da prosa literária angolana, muitas vezes preso a temáticas exaustivamente trabalhadas (e muito bem trabalhadas) por nomes consagrados como Luandino Vieira, Arnaldo Santos entre outros. João Melo fornece-nos um panorama caótico do país, de uma sociedade entregue aos perigosos caminhos das regras neoliberais do mundo globalizado, e as mazelas dessa situação na cidade de Luanda o narrador não teme em descrever:

Mais um dia em Luanda. O lixo deitado ontem à tarde pelos chamados pacatos cidadãos amanheceu incólume. As putas tiveram uma jornada infrutífera e já foram dormir há algumas horas, com vontade de se matarem ou de se casarem com um gringo. Os farristas voltam para casa, alguns deles por simples inércia, outros por autêntico milagre. Os ladrões, pelo menos os, digamos assim, artesanais, acabaram de proceder à avaliação do pecúlio arrecadado em mais uma noite de labuta e preparam-se para o merecido repouso. Os doutores e os ministros, ocupadíssimos como sempre, ainda dormem o sono dos justos, pelo menos por enquanto. As mulheres começam a ocupar os seus postos: as bancas dos mercados, as esquinas, as ruas, praças e avenidas da cidade, vendendo seus produtos, dos tradicionais aos globalizados. É por isso, com certeza, que alguns dizem que Luanda agora não passa de um grande bazar. O que resta da tradicional pequena burguesia luandense deve roer as unhas de raiva com isso, mas que tenho eu a ver com ela? (p. 61-62)

Angola sofreu várias mudanças no decorrer do século XX aos dias atuais. Da guerra colonial, iniciada nos anos 1960, à independência em 1975, passando pelos anos de socialismo e a posterior guerra fratricida que durou até o ano de 2002, e agora a entrada no mundo capitalista globalizado. Em seus contos, João Melo não deixa de mencionar os rumos do processo histórico angolano com ironia:

O nosso querido país, como se sabe, tem uma historia muito rica e diversificada, eu diria mesmo – embora correndo o risco de ser considerado mais um ufanista – sui generis. O nosso assim chamado processo histórico já passou por tantas fases, etapas, contextos e conjecturas, que a maioria, pelo menos até agora, tem tentado tudo para entendê-lo, mas apenas tem desconseguido, ou não fosse esse saboroso verbo uma criação tipicamente angolana. Os computadores da CIA, por exemplo, já tiveram de ser investigados várias vezes, pois, ao contrário das suas previsões rigorosamente binárias, os angolanos conseguiram chegar vivos ao século XXI. (p. 37)

A historiografia é uma constante em The Serial Killer..., João Melo rememora passagens da recente pátria angolana para entremear seus personagens na criação dos seus contos, como em “O Esquadrão Marreco”, que retrata o “Período dos Búlgaros e do Peixe Frito” (p. 37), época de escassez e racionamento na economia do país nos anos 1980 devido à guerra fratricida, causando grandes transtornos à vida da população:

posso dizer que a designação de tal período resultava do facto de se viver, então, uma época de profunda escassez alimentar, mas de alguma abundância em termos de fornecimento de cerveja, de tal maneira que, em todos os restaurantes da cidade, quando se pedisse alguma coisa para comer, o garçom trazia invariavelmente um prato de arroz com peixe frito e uma bandeja de finos servidos em búlgaros (frascos de compota provenientes da Bulgária e que, uma vez esvaziados do seu conteúdo original funcionavam como copos). É nesse tempo que se situa a estória do Esquadrão Marreco. (p. 38)

Os descaminhos da revolução e o afastamento dos dirigentes políticos dos ideais da independência são denunciados em diversos contos de Melo. A corrupção, o tráfico de influências, o carreirismo e o conseqüente enriquecimento ilícito são alguns dos temas abordados na ficção a respeito da nova burguesia angolana e tratados ironicamente pelo narrador em “Uma estória canina” e “O rabo do chefe”:

Tinha sido nomeado, há menos de um ano, administrador de uma subsidiária da companhia estatal de petróleo, o que o catapultou, definitivamente, para o reduzido e fechado círculo que comanda os destinos do país, com toda a justiça, aliás; (...)
Detalhe: aparentemente, e falando curto e grosso (vocês já me conhecem, não é?), ele não tinha grande breine para ser administrador de porra nenhuma, quanto mais dessa empresa em que o colocaram, mas um extraordinário acaso tornou possível o que ainda hoje muitos consideram inacreditável. O facto é que, um dia qualquer, (...) reencontrou um amigo de infância que não via praticamente desde a independência e que, segundo ele sabia, se tinha tornado uma das pessoas mais influentes do país. (p. 22-23)

O Doutor Chico, em vez de dirigir convenientemente a ELMA, U.E.E., como rezam os manuais de gestão da coisa pública (pelo menos desde que o capitalismo, nos principais centros, se civilizou), utilizou o seu cargo de director-geral, desde o primeiro dia, para resolver os inúmeros problemas pessoais, ou seja, para se safar, como costuma afirmar o já várias vezes mencionado povo em geral. É por isso que, a partir de uma dada altura, quando a roubalheira passou a ser feita às escâncaras, isto é, quando a gestão se transformou, digamos assim, em simples “mamação”, os trabalhadores o apelidaram de “Chico Mamão” (o que, obviamente, não tem nada a ver com a fruta homônima).
(...) De igual modo não apontarei o meu dedo acusatório aos variados indícios do seu espantoso, gradual e consistente enriquecimento nos últimos dez anos. (p. 34-35)


Isto se dá por causa da grande produção de petróleo em território angolano explorado por empresas estrangeiras, que encontraram uma elite submissa pronta a se submeter às vontades do capital internacional em troca de vantagens pessoais, desconsiderando o que é importante para a nação e até a soberania da mesma. Um problema comum não só aos países africanos, mas estende-se aos países latino-americanos.

Um dado importante é a maneira como o narrador trata o passado comunista de Angola, seus ícones, vocabulário e ideais revolucionários. São tratados com ironia e muitas vezes sarcasmo, em situações que seriam inadmissíveis nos primeiros anos da revolução. Assim, as táticas de guerrilha de Mao Tsé-Tung são adaptadas em um manual para que os homens se aproximem de mulheres, em “O livro da deambulação”:

Estas duas etapas – a abordagem e o papo – pertencem ainda à fase do cerco. Se correrem bem, passa-se então à fase do aniquilamento, como diria o mais-velho Mao Tsé-Tung (quem diria que o velhote, além de um teórico da luta de guerrilhas, também gostava de outros tipos de combates, hein?!) (p. 48)

ou o desprezo com o passado revolucionário e o encantamento com a competitividade capitalista, no conto “O celular”: “Depois da independência, dei uma de revolucionária (eu estava mesmo maluca!...) e ingressei nas FAPLA, mas felizmente consegui sair... Agora sou uma mulher de negócios!” (p. 16).

Conseqüência da época vivenciada por nós, dominada pela economia neoliberal e pela globalização, os contos de João Melo acusam o mal-estar emitido pelo consumismo desmedido da sociedade contemporânea sob as garras do capital. Em Angola não poderia ser diferente, o exibicionismo que beira o ridículo da nova burguesia é duramente criticado pelo narrador:

Um rico que se preze, seja ele velho ou novo, tem que ter três coisas, pelo menos (além de muito cumbu, claro): cão, guarda pessoal e uma amante. Guarda e amante ele tinha, mas cão, não. Recusava-se terminantemente a ter bichos de qualquer espécie, na casa oficial (era assim que ele designava a casa onde morava com a chamada esposa e mais três filhos) ou até mesmo no apartamento que recentemente arranjara para a amante. (p. 21)

A efemeridade e a inevitável mediocridade das celebridades atuais aparece no conto “Caricatura do escritor enquanto jovem”. Aqui, um jovem escritor de talento para lá de duvidoso e extremamente polêmico, Pedrito Manungola, alcança espaço na mídia mais pelas declarações bombásticas do que pelo talento literário, procurando derrubar cânones da literatura angolana:

O consagrado poeta Manungola, na verdade, nem sequer tinha 30 anos de idade, mas já era consagrado porque uma vez, num recital de poesia na União dos Escritores Angolanos, começou a gritar que o maior poeta angolano não era Agostinho Neto, como a propaganda oficial do regime tentava impingir a todos os angolanos e até à própria comunidade internacional. O maior poeta angolano de todos os tempos, contando (ou descontando?), inclusive, os mortos, era ele, Manungola, (...) ao contrário do que Agostinho Neto e sua camarilha (desde que ouvira um comissário provincial apresentar com essa fórmula o poeta-presidente e os ministros que o acompanhavam, durante um comício popular, Manungola nunca mais deixara de utilizá-la, apenas lamentando não ter sido ele a cria-la) (...) (p. 49-50)

Em uma sociedade que preza o espetáculo, “artistas”, com comportamento deplorável, atingem seus exíguos momentos de fama proferindo declarações inescrupulosas, infundadas e sem o mínimo de ética. O personagem Manungola com sua metralhadora giratória em um denuncismo incontrolável, ataca a suposta política que comanda a literatura angolana em um programa de televisão:

Manungola deu um verdadeiro show, demonstrando as suas fabulosas qualidades histriónicas. Começou por dizer que a poesia política é uma merda. Que a questão do conteúdo da literatura é um resquício do centralismo democrático. Que Jdánov era filho de alguém que, lamentavelmente, ele não poderia mencionar, por estar na televisão. Que os escritores mais antigos estavam tão obcecados pelo colonialismo – coisa com que a geração dele, Manungola, não estava muito inquieta – que não reparavam nos erros cometidos após a independência pelos ditos revolucionários. Que, mais do que discursivos, eram prolixos e cantalutistas (...). Que existe uma conspiração dos mais velhos, que tudo fazem para impedir o surgimento de novos valores literários no país. Que os piores são os luso-descendentes, os quais, além de receberem todos os prémios literários do país, ainda implicam com os jovens escritores, pois estes, alegadamente, não dominam a língua portuguesa. (p. 50-51)

Entretanto, nem só de críticas negativas são feitos os contos de The serial killer... Há espaço para o humor e o fascínio que a cidade de Luanda pode causar a um estrangeiro, como narrado no hilariante “O engenheiro nórdico”. Trata-se da história de um estrangeiro que é transferido para trabalhar em Angola, só que antes estuda os hábitos do país, assiste a palestras e conhece a literatura local. Quando chega a Luanda decidi ir ao célebre mercado Roque Santeiro, para experimentar uma comida tradicional, o cabrité: “Coincidência ou não, apanhou uma tremenda amebíase, que o deixou prostrado durante uma semana, a cagar feito um condenado à morte” (p. 28).

O caso virou uma grande maka (confusão) nacional a respeito das péssimas condições de higiene do mercado, envolvendo governo e oposição, e o narrador, sempre com ironia, mostra a desestabilidade política do país. A oposição se pronunciava:

Para a oposição, por exemplo, tinha ficado clara, mais uma vez, não apenas a falta de capacidade, mas sobretudo a profunda insensibilidade do governo perante os problemas do povo, pois há muito tempo que os cabriteiros do Roque Santeiro, e não só, reclamavam em vão por melhores condições de trabalho, a fim de poderem mitigar a fome do povo e até mesmo, se não a fome propriamente dita, pelo menos o apetite dos estrangeiros, no mínimo daqueles que, dando mostras do seu multiculturalismo exemplar, faziam questão de experimentar os quitutes nacionais, recusando-se, portanto, a viver apenas de importados e enlatados. (p. 28)

Tais declarações fizeram com que o ministro do Interior fosse à televisão, em rede nacional, e rebatesse com veemência as críticas sofridas:

qualificar de savimbistas todos aqueles que se atrevessem a pôr em xeque o empenho do governo em melhorar as condições higiénicas da cidade e, principalmente, em bem receber aqueles que, de boa-fé, vinham contribuir com o seu esforço para a reconstrução e desenvolvimento do país. No tempo em que estes factos inventados, ser savimbistas era pior do que ser filho da puta. (p. 29)

A imposição da religião católica imposta pelos séculos de colonialismo é tratada no conto “O baptizado”. Neste, o personagem Godofredo tem trinta e dois filhos em um relacionamento poligâmico com suas “três mulheres, uma preta, uma mulata cafusa e uma albina” (p. 80). Nenhum deles havia passado pelo batismo cristão, o que escandalizou o novo padre recém chegado ao vilarejo interiorano, que “resolveu imediatamente desencadear uma cruzada contra o herege” (p. 77).

A conturbada relação de Portugal e dos portugueses com sua ex-colônia é sentida até os dias atuais e em dois contos, “Vêm aí as portuguesas” e “A herança”, apreendemos os preconceitos e mitos que acercam o imaginário luso quando se trata de Angola. No primeiro, o problema é sobre as mulheres angolanas que seduzem e enfeitiçam os homens brancos portugueses:

A RTP Internacional, vulgo RTPi, interrompeu a sua programação normal, para transmitir em directo a manifestação de um grupo de mulheres no Terreiro do Paço, em Lisboa, que exigia do governo português apoio para a sua deslocação a Angola, a fim de resgatarem os respectivos maridos das garras pecaminosas daquelas negras e mulatas que os haviam seduzidos com pozinhos e mandingas ainda desconhecidos pela ciência (...) (p. 97)

No segundo conto, a hipocrisia tenta encobertar o preconceito racial latente na carta enviada pela família e lida por um português, morador de Luanda, casado com uma negra, que comenta, com raiva e revolta, o relato dos seus parentes e a idéia em Portugal de atraso tecnológico do continente africano. Como se o país luso não fosse responsável por impedir o desenvolvimento angolano durante a colonização:

Esperamos sinceramente que esta missiva o vá encontrar de boa saúde, em companhia dos seus, em especial a D. Paciência, sua esposa, e os seus quatro filhos. (...) A propósito, nunca mais tivemos notícias de nossos amados sobrinhos. Como vão eles? (...)
“Olha-me os cínicos! Olha-me os hipócritas! Os gajos nunca quiseram saber da minha família, em particular dos meus filhos – ‘Então, você também resolveu fazer mulatos?’, perguntaram-me eles na cara, na primeira e única vez que levei a Paciência e os garotos a Portugal, para conhecerem a sua família portuguesa (...)” (p. 105)

Olhe, já agora, pode tirar-nos uma dúvida, pois aqui em casa ninguém sabe a resposta? Há dias, perguntámos igualmente ao compadre Mota, que já esteve em África, mas ele também não sabe... Vocês aí em Angola têm televisão?
“O quê?! Ora, ora... Então esses tipos, apenas porque o governo lhes pôs lá na terrinha uma caixinha de fabricar doidos, agora estão armados de finórios?... Se eu tivesse mais paciência, dir-lhes-ia o que é a televisão... Mas, infelizmente, jamais os aturei. (...)” (p. 107)


João Melo em sua literatura procura enfatizar o multiculturalismo angolano. A diversidade étnica é valorizada em seus textos como forma de integração do país em negros, brancos e mestiços. Todavia, o preconceito racial na sociedade contemporânea está presente e é denunciado pelo narrador em praticamente todos os contos. A personagem Chiquinha Setenta, por exemplo, ao anunciar o roubo de seu celular, acusa um albino: “Chiquinha Setenta fez tenção de se atirar contra o albino, que olhava para ela com nítido terror, talvez pensando nas enormes provações por que tem passado (e, não se iludam, continuará a passar) a sua raça” (p. 18). A conduta dela é recriminada pelo policial que tenta desvendar o assalto: “E porquê que escolheu logo um albino? Isso é descriminação!” (p. 19).

O preconceito em relação aos mestiços é abordado no conto “O mulaticida”. Neste, a posição radical de um negro, “o tema da raça sempre foi uma obsessão para ele” (p.113), contra os “mulatos” beira o hilário, com afirmações estapafúrdias de enriquecimento e favorecimento político:

(...) posso dizer-lhes que ele é daqueles que ainda acredita, hoje, quase trinta anos volvidos após a independência, que o poder em Angola é controlado pelos mulatos. Eu acho isso bizarro, pois basta ver as fotos dos membros do governo para verificar que esse tempo já passou. De igual modo, ele ainda não ultrapassou outra ficção, segundo a qual os mulatos são os mais ricos do país. (p. 113)

O exílio voluntário de um angolano é narrado no conto “O exilado”. Ngolo Valentim é um músico que fixa residência em Estocolmo, capital sueca, e após vários subempregos consegue se firma como músico de jazz. A onomástica presencia-se, Ngolo refere-se ao famoso grupo do período colonial angolano Ngola Ritmos, enquanto Valentim menciona a valentia do jovem que saiu do seu país e se aventurou no exterior. Ngolo Valentim assimila-se ao padrão de vida sueco e é grato pela nova vida:

Na verdade, naquela “cidade verde junto à água”, com mais de sete séculos de história e tão longe do Andulo, no coração perdido de Angola, ocorreu o seu segundo nascimento. Ele seria eternamente grato aos “deuses brancos” que o acolheram e lhe deram uma espécie de segunda existência. (p. 84)

Sobre o conto “The Serial Killer” várias leituras podem ser feitas, dentre as quais a da metáfora dos dirigentes políticos que arrasam o país, escondendo-se na despersonalização, a capacidade de metamorfosear-se de acordo com as mudanças políticas em detrimento dos interesses da população. Situação típica dos países periféricos e grande mal que reprime o desenvolvimento dessas nações:

– O seu nome?
– Qual deles?
– Bem, como é que você se apresenta?
– Depende...
– Depende?
– Sim, depende. Não sabe o que é depender? É...
– Sei, sei. Mas depende de quê?
– Ora, não imagina? Do contexto, das minhas conveniências... (p. 11)

Depreendemos nos contos de The Serial Killer e outros contos risíveis ou talvez não a preocupação de João Melo em dissecar as entranhas da sociedade angolana contemporânea, as incoerências e distorções de uma época dominada pela superficialidade e competitividade das relações, da ganância e ausência de escrúpulos da classe política. Atento aos incontáveis problemas que se passam durante a construção de Angola, João Melo faz da sua literatura instrumento para denunciar os absurdos da situação vigente. Aliás, a melhor maneira de se fazer literatura na contemporaneidade.



BIBLIOGRAFIA:

MELO, João. The Serial Killer e outros contos risíveis ou talvez não. Lisboa: Caminho, 2004.

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